UFRN: Pesquisa identifica primeiro diagnóstico de osteomielite aguda em um fóssil de dinossauro

Você já pensou que uma infecção óssea pré-histórica, da era dos dinossauros, poderia contribuir para o avanço da compreensão sobre a doença na medicina moderna? Pois bem, uma descoberta dos paleontólogos da UFRN, Aline Ghilardi e Tito Aureliano, junto a outros três pesquisadores brasileiros, permitiu o primeiro diagnóstico de osteomielite aguda em um fóssil de dinossauro. É a primeira vez que o desenvolvimento histológico da enfermidade foi descrito em detalhes e traz importantes contribuições para o estudo da doença. 

A osteomielite é uma infecção óssea bastante conhecida que causa deformações nos ossos, atingindo humanos e outros animais; a surpresa é a sua presença, de forma agressiva, em um fóssil de dinossauro. Inicialmente detectada por Aline Ghilardi, a descoberta foi feita a partir da análise dos ossos de um titanossauro idoso brasileiro, que viveu onde hoje é o Sudeste do Brasil, durante o Período Cretáceo.

O descobrimento surgiu por acaso, enquanto Aline fazia seu pós-doutorado na Universidade Federal de São Carlos, quando se deparou com caroços esponjosos no osso da perna de um  titanossauro. A princípio, os pesquisadores acreditaram ser um tipo de câncer ósseo e só descobriram que se tratava de uma osteomielite aguda quando o material foi cedido para ser analisado durante o mestrado de Tito Aureliano, em 2018. 

Lesão começava desde a parte mais interna do osso e se estendia até a superfície, onde se encontravam os caroços esponjosos observados pela paleontóloga

Durante os estudos posteriores, por meio de uma tomografia computadorizada, foi possível observar que a lesão começava desde a parte mais interna do osso e se estendia até a superfície, onde se encontravam os caroços esponjosos observados pela paleontóloga Aline. O estágio da doença era tão avançado que os pesquisadores acreditam que uma série de feridas com pus teriam se aberto na pele do animal durante sua vida, causando muita dor. Essa característica, inclusive, fez com que os cientistas o apelidassem carinhosamente de ‘Dino Zumbi’.

Publicado na revista Cretaceous Research, o estudo foi construído em colaboração com o Instituto de Geociências da Universidade de Campinas (Unicamp); o Laboratório de Icnologia e Osteohistologia de Dinossauros (DinOLab), do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN); e o Laboratório de Paleoecologia e Paleoicnologia (LPP), do Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva (DEBE) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

Material recolhido foi analisado durante o mestrado do paleontólogo Tito Aureliano, em 2018

Na busca pela causa da doença

No processo pela causa da osteomielite no dinossauro, os pesquisadores perceberam a carência de dados histológicos sobre a doença. O seu desenvolvimento não era conhecido ao nível microscópico até mesmo na medicina moderna. Por isso, os pesquisadores estudaram em detalhes a infecção, identificando até mesmo o momento em que a ferida se abriu, no passado, e foi colonizada por bactérias.

Em meio às análises microscópicas, 70 parasitas foram identificados pela paleoparasitóloga Carolina Nascimento (UFSCar) ao longo dos vasos sanguíneos do fóssil, levando os pesquisadores a concluírem que as lesões foram causadas ou facilitadas por esses microrganismos. Além da descoberta da osteomielite pelos pesquisadores, essa é também a primeira vez que parasitas foram encontrados preservados dentro dos ossos de dinossauros em um estudo. Antes, só se havia encontrado parasitas pré-históricos dentro de insetos preservados em âmbares ou em fezes fossilizadas.

Demonstração da presença dos parasitas nos canais vasculares do fóssil. Imagem: Hugo Cafassoto

A preservação desses microrganismos pode ter sido favorecida pela geologia do local onde o fóssil foi encontrado. “Havia no lugar, no passado, um grande rio que era submetido a épocas de chuva e seca intensas. Possivelmente a morte tenha ocorrido em um período chuvoso, já que os restos do dinossauro foram soterrados relativamente rápido ao ponto de ocorrer uma mineralização precoce. Depois de soterrado, uma remobilização dos próprios minerais presentes nos ossos pode ter iniciado o processo de fossilização dos parasitas”, afirma Aline Ghilardi.

Inéditos, os dados obtidos pelo estudo são importantes para o avanço da compreensão da doença na medicina atual e no tratamento da doença em humanos. Além disso, abre novas possibilidades para paleontologia, já que também foi a primeira vez que se uniram os campos da histologia, patologia e parasitologia aplicados aos fósseis. As análises dos parasitas, por exemplo, segue sendo feitas por Aline Ghilardi e Carolina Nascimento e devem ser apresentadas em trabalhos futuros.

Para saber mais sobre o processo de toda a pesquisa, confira o vídeo detalhando a descoberta, postado no Canal “Colecionadores de Ossos”, comandado pela Aline Ghilardi e Tito Aureliano. 

Texto: Marcelha Pereira
Fotos cedidas