No Rio Grande do Norte, pequenas cidades estão à beira da falência

Prefeitura de Bento Fernandes não vê perspectivas imediatas de melhora fiscal. Da receita de R$ 470 mil, por mês, cerca de R$ 340 mil são gastos somente com o pagamento do funcionalismo

O crescimento pífio da economia do Brasil nos últimos dois anos e a projeção de 0,85% neste ano tem uma consequência direta na realidade dos pequenos municípios, deixando-os à beira da falência e imobilizados com as dívidas. Essa situação é presente em parte das 167 cidades do Rio Grande do Norte. Estudos e levantamentos recentes mostram que 66 dos municípios locais não conseguem pagar contratos com empresas prestadoras de serviço e outros 91 gastam mais da metade do que conseguem arrecadar com servidores – que têm despesas que crescem a cada ano.

Na avaliação do professor do Departamento de Políticas Públicas (DPP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Anderson Santos, a crise financeira dessas cidades é mais grave e têm menos soluções porque são municípios “com economia e burocracia frágil”. “Esses municípios dependem basicamente do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), têm baixa capacidade de arrecadar impostos e um número muito grande de servidores com a produção baixa”, declarou.

Sem crescimento econômico expressivo no País, essas cidades passam a sofrer com elevação vegetativa (automático) de gastos, como o salário do funcionalismo público, ao mesmo tempo que não possui aumento das receitas. Um exemplo expressivo local é o município de Pureza, de 9 mil habitantes. Em 2010, a Prefeitura gastava 55% do que arrecadava com o pagamento dos salários. Esse percentual chegou a 92,4% no segundo bimestre deste ano, nove anos depois, segundo dados do Tribunal de Contas do Estado (TCE).

Para voltarem a crescer, defende Santos, é necessário que haja um esforço do Governo Federal, que detém a maior parte da arrecadação do Brasil (cerca de 60%), porque as menores cidades não têm capacidade de investir com recursos próprios ou atrair a iniciativa privada. “Para eles (municípios) as pessoas são pobres, ou seja, não consomem; se não consomem, não atraem investimento privado para esses locais”, considera. “Cabe ao Governo (Federal) aumentar a demanda. Ele pode fazer isso de várias formas, inclusive investindo em infraestrutura”.

Anderson Santos ainda afirma que uma das poucas medidas que os municípios podem fazer é cortar gastos. Isso, argumenta o professor, diminui ainda mais a capacidade de operação desse município e não soluciona o problema, dependendo da gravidade. “Se torna um ciclo vicioso que vai se agravando cada vez mais”.

Nacionalmente, a situação das pequenas cidades se evidencia pelo debate do pacto federativo. A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) defende que haja um aumento no valor do Fundo de Participação do Município, verba obrigatória que atualmente repassa cerca de 20% da arrecadação brasileira com o Imposto de Renda e Imposto sobre Produto Industrializado para os entes. A discussão interessa também o Governo Federal e hoje está no Congresso Nacional.

Sem considerar transferências obrigatórias do Governo Federal para áreas essenciais, como saúde (SUS) e educação (Fundeb), as menores cidades dependem quase exclusivamente do FPM. Em Bento Fernandes – que decretou calamidade financeira no dia 31 de agosto -, a transferência corresponde a cerca de 80% das receitas mensais. Outros 20% são provenientes da arrecadação própria com ICMS.

Para Santos, a discussão do pacto federativo por si só não representa uma mudança positiva para as cidades. Ele afirma que é preciso estar atento para o norte da repactuação ser o aumento de recursos do FPM, não a diminuição de responsabilidade dos Municípios, estabelecidas na Constituição Federal de 1988. “No ‘frigir dos ovos’, é necessário que o Governo Federal aumente o volume para os municípios e também aja para promover o desenvolvimento econômico”, declarou.

Números

66 cidades do RN não conseguem pagar prestadores de serviços

91 cidades do RN gastam mais da metade de recursos somente com a folha de pagamento de servidores

Fonte: CNM e Femurn